Texto escrito por Antonio Carlos Popinhaki
Brigham Henry Roberts nasceu em 13 de março de 1857 e faleceu no dia 27 de setembro de 1933, com 76 anos. Em vida, ele foi um historiador, político e líder da igreja Mórmon brighamita (Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias). Dentre seus trabalhos, encontramos a edição e a publicação dos sete volumes da história da igreja. Esse trabalho é composto de escritos e interpretações do fundador do mormonismo, Joseph Smith Júnior, bem como, comentários editoriais dos seus secretários e escribas. Depois da morte de Smith, historiadores do mormonismo, desde 1839 até 1856 continuaram escrevendo. Parte desses escritos foram publicados no periódico Mórmon “Times and Seasons” e em outras publicações da igreja. Posteriormente, esses escritos foram reunidos na íntegra com extensas anotações e edições de B.H. Roberts como parte de uma série de sete volumes iniciada em 1902 como a “História da Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias”. Ele editou uma história popular de seis volumes da Igreja SUD e também escreveu “Estudos do Livro de Mórmon”, que foi publicado postumamente, disponível na plataforma da Amazon. Nesse último trabalho, Roberts discute a validade do Livro de Mórmon como um registro antigo.
Sua trajetória de vida passou por momentos de extrema dificuldade, pobreza e privações. Nasceu em Warrington, Lancashire, na Inglaterra. Chegou a Salt Lake City ainda criança. Se estabeleceu na localidade de Bountiful, local que foi considerado por ele como o seu lar. Na sua juventude, Roberts trabalhou como mineiro. Também foi ativo e participativo em atividades da juventude da época, como adepto de jogos e consumidor de bebidas alcoólicas. Uma vez, foi advertido e disciplinado por um bispo Mórmon de que deveria parar de beber álcool. Então Roberts acabou aprendendo a ler e, após uma série de empregos, foi aprendiz de um ferreiro enquanto frequentava a escola.
Nesse tempo ele se tornou um “leitor voraz”, devorando livros de história, ciência, filosofia, especialmente o Livro de Mórmon. Também se interessou por outros textos religiosos da história do mormonismo. Em 1878, Roberts casou-se com Sarah Louisa Smith e, no mesmo ano, formou-se como o primeiro da classe na Universidade de Deseret, a precursora da escola normal da Universidade de Utah.
Roberts também foi um apologista da igreja. Ele escrevia e rebatia “a favor da doutrina” questões levantadas e que colocavam, porventura, em dúvida, a fé dos membros da época. Na igreja, ele cresceu na hierarquia e chegou até o Quórum dos Setentas, cúpula restrita de Autoridades Gerais. Todas as orientações e determinações no mormonismo partem desse seleto grupo.
Em 1859, Charles Darwin publicou um livro que se tornou mundialmente famoso e conhecido intitulado “A origem das espécies”. O conteúdo desse livro serviu de combustível para inúmeras discussões, principalmente no mundo religioso. Igrejas de diversas denominações e variantes nas ramificações do cristianismo, debateram arduamente os resultados dos estudos de Darwin. Contemporaneamente, um ramo da ciência chamado de “arqueologia”, começou a ganhar notoriedade. A arqueologia é uma disciplina ou uma ciência que se ocupa em procurar, mapear e datar vestígios materiais da presença humana na Terra.
Com a publicação de Darwin e a aliada arqueologia, uma parcela dos membros do mormonismo ficaram animados, principalmente para mostrarem ao mundo as “provas” de que os escritos do Livro de Mórmon eram verídicos. Eles acreditaram que seriam descobertas ruínas em algum lugar do continente americano, que confirmariam o texto do livro aceito como sagrado pela corporação. Também acreditaram que uma vez encontradas essas ruínas, certamente, seriam encontrados ossos e vestígios dos seus habitantes, podendo seus restos mortais serem comparados com os ossos humanos do final do século XIX e início do século XX, testando os estudos de Charles Darwin. Porém, nunca foram encontradas nenhuma ruína que pudesse datar ou se encaixar caracteristicamente como uma das cidades citadas no Livro de Mórmon. Nem foram encontrados vestígios que pudessem corroborar para a produção de uma prova.
B.H. Roberts estava entre esses eruditos pesquisadores. Ele, mais do que ninguém dentre os milhares de mórmons, queria poder provar ao mundo de que o Livro de Mórmon não fora uma obra literária, fruto da imaginação humana. Roberts “frequentemente tinha uma visão mais ampla” do posicionamento da liderança da igreja que diz respeito ao “esquema celestial das coisas”. Em 1902 ele disse aos santos que enquanto a Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias tiver uma parte no grande dilema da comprovação da obra, não seria a única força, nem o único meio que o Senhor empregaria para levar a efeito aquelas coisas das quais “Seus profetas”, nos tempos antigos testificaram. A teologia de Roberts incluía a crença numa “doutrina liberal moderna do homem e no otimismo do século XIX, e era necessária uma mente ousada, rebelde e espaçosa para compreender sua total implicação”. Ele então escreveu um texto de cunho teológico e esperava que a igreja o publicasse. Ele o nomeou como “A verdade, o caminho, a vida”, mas a sua tentativa de usar a teoria científica contemporânea para apoiar a doutrina Mórmon levou, em 1930, a um conflito com o apóstolo Mórmon Joseph Fielding Smith. A influência dos escritos de Darwin fez com que a igreja não publicasse o trabalho de Roberts na época, apesar de haver um empate entre os membros do Quórum dos Doze Apóstolos. O trabalho foi publicado em 1994, sessenta e um anos após a sua morte.
Certa vez, um membro da igreja recebeu de um amigo pesquisador do mormonismo, depois da leitura do Livro de Mórmon, algumas questões. O membro da igreja, não podendo respondê-las, escreveu então, para o apóstolo e historiador da igreja James E. Talmage para elucidar essas dúvidas. Talmage não soube responder aos questionamentos, mesmo sendo um “apóstolo”. Após receber e ignorar três cartas desse membro, como recurso derradeiro, encaminhou-as para B.H. Roberts para que pudesse dar a sua resposta. Talmage acreditou que o colega, como historiador, apologista e intelectual pudesse ajudar. Essas eram as questões de dúvida:
1 — Como poderia a grande diversidade das línguas indígenas primitivas e seus dialetos terem ocorrido em tão pouco tempo, até cerca de 400 d.C.? Se os nefitas chegaram nas Américas em 600 a. C., falando hebraico, porque eram descendentes da “casa de Israel”, e escrevendo em “egípcio reformado”, que é um idioma que não existe, como explicar a existência de centenas de dialetos indígenas, sendo que nenhum deles tem traços característicos da língua hebraica?
2 — O Livro de Mórmon diz que os seguidores de Leí, chegando nas Américas, encontraram cavalos. Como explicar isso? Se não havia cavalos, mesmo na época do descobrimento, em 1492 por Cristóvão Colombo?
3 — Os antigos judeus não tinham conhecimento de aço em 600 a. C., no Livro de Mórmon diz que Néfi teve em seu poder uma espada de aço quando partiu de Jerusalém. Como explicar isso?
4 — O Livro de Mórmon fala de “espadas” e “cimitarras”, sendo que a palavra “cimitarra” não aparece em nenhuma literatura antiga, até por volta de 600 d. C. até o século XIV. Sendo originária da Pérsia, a cimitarra é um sabre oriental, largo e curvo muito conhecido no meio muçulmano antigo. Como explicar isso? Como essa palavra se tornou conhecida entre os lamanitas e nefitas, sendo que ela surgiu há séculos no futuro e em outro continente?
5 — Apesar de a seda não ser conhecida na América, os nefitas a usavam. A seda veio da China. A manufatura da seda era um segredo de estado, muito bem guardado até o ano 300 d. C., quando se tornou conhecida na Índia. Como explicar isso?
Quando B.H. Roberts recebeu essas perguntas do apóstolo James E. Talmage, ele se deu conta de que não tinha as respostas e não poderia ajudar o colega. Apesar de ter lido o Livro de Mórmon, inúmeras vezes, sentiu naquele momento que o testemunho e a inspiração não eram suficientes para poder responder às dúvidas apresentadas. Ele então redigiu um documento com 141 páginas abordando problemas encontrados por ele com a historicidade do Livro de Mórmon. Fez uma cópia e a entregou ao presidente Heber J. Grant, informando-o de que as questões apresentadas eram mais sérias do que pensava, que a igreja tinha a responsabilidade de arcar com o “ônus da prova”, ou seja, que a instituição religiosa tinha a obrigação de fornecer garantias suficientes para sustentar a sua posição.
Foi convocada uma reunião com a “Primeira Presidência”, o “Quórum dos Doze” e o “Quórum dos Setentas” para debaterem o assunto. B.H. Roberts encontrou uma falha envolvendo a doutrina e sua principal ferramenta, o Livro de Mórmon. Ele esperava que as “Autoridades Gerais” achassem a solução. No final de 1911 houve a reunião objetivando atender o apelo de Roberts. Ele tinha uma preocupação genuína de que caso não houvesse respostas convincentes, a fé dos membros seria abalada e a própria igreja poderia cair. Depois de dois dias inteiros, não chegaram a nenhuma conclusão.
Depois do fracasso por parte das “Autoridades Gerais” na obtenção das respostas sobre a historicidade do Livro de Mórmon, B.H. Roberts começou a se questionar: “seria possível que Joseph Smith Júnior tivesse inventado ou criado de forma literária, as histórias contidas no Livro de Mórmon?” No seu pensamento: “se ele criou, de onde e como foi feito isso?” — Aprendera desde pequeno que o jovem Smith era iletrado e incapaz de produzir uma obra como o Livro de Mórmon. A ideia não saiu da sua mente.
Mais tarde, tempos depois, em meio às suas pesquisas, B.H. Roberts se deparou com um livro intitulado “Visão dos hebreus” de Ethan Smith, um antigo pastor de uma congregação da qual fazia parte Oliver Cowdery, um dos escribas de Joseph Smith Júnior. Esse livro fala de um povo que chegou às Américas num barco. Eles eram judeus, aconteceu uma guerra entre eles depois de se dividirem em dois grupos, um bom e o outro mau. O grupo de pessoas malvadas venceu a guerra, matando as pessoas boas. Isso soou de forma familiar para Roberts. O livro foi publicado em 1823, sete anos antes da publicação do Livro de Mórmon. Ele se convenceu que “Visão dos hebreus” foi o livro que serviu de inspiração para que Joseph Smith Júnior produzisse o Livro de Mórmon.
Incomodado com o que descobriu, B.H. Roberts escreveu um segundo documento para o presidente da igreja, ele chamou o seu trabalho de “Um estudo do Livro de Mórmon”. Não sendo contemplado e nem atendido em seu apelo, então, ele escreveu um terceiro documento, onde relatou para o líder maior do mormonismo, todas as similaridades encontradas nos dois livros. Ele fez várias cópias e as fez circular entre todos os integrantes das Autoridades Gerais da igreja, entretanto, todos resolveram ignorar o seu trabalho e nem ao menos quiseram se reunir com ele para discutir o assunto.
Tão logo B.H. Roberts faleceu, os líderes da igreja se apossaram de todos os seus manuscritos e trabalhos a que tiveram acesso e os trancaram em cofres secretos e intocáveis. Nos anos 1980, o filho de um apóstolo, logo que seu pai faleceu, entrou em contato com membros da família de B.H. Roberts. Ele queria saber se esses familiares tinham manuscritos originais dos documentos enviados no início do século para a presidência da igreja. Os familiares disseram-lhe que tinham. Que esse homem poderia publicar os manuscritos, caso desejasse fazê-lo. A igreja, através de advogados, tentaram impedir a publicação, sem êxito, pois os manuscritos eram originais, da mesma forma que aqueles que foram escondidos do mundo nos cofres secretos.
Os três documentos foram publicados, contestando e deixando dúvidas sem respostas até os dias de hoje, quanto à veracidade dos textos do Livro de Mórmon. O paralelo entre o livro “Visão dos hebreus” de Ethan Smith, com as histórias do Livro de Mórmon foram fundamentais para que muitas pessoas deixassem de acreditar na obra como divina, uma vez que o texto original sofreu milhares de alterações de todas as formas, tentando mascarar, manipular, consertar, corrigir e esconder esses paralelos.
Roberts estava “dividido por uma luta interna entre a sua fé e o desejo de ser honesto consigo mesmo”. Ele concluiu que as “evidências” apresentadas apontavam para Joseph Smith Júnior, como o criador do Livro de Mórmon.
Referências para o Texto:
A História da Igreja: Disponível em: https://en.wikipedia.org/wiki/History_of_the_Church_(Joseph_Smith)#Volumes
B. H. Roberts: Disponível em: https://en.wikipedia.org/wiki/B._H._Roberts
B. H. Roberts e o Livro de Mórmon - Parte 1. Disponível em: https://podcasts.google.com/feed/aHR0cHM6Ly9hbmNob3IuZm0vcy8zODRmZDkwOC9wb2RjYXN0L3Jzcw/episode/NTc5MTkzZjMtMWQ4MC00YTA1LWE5NDItZTBkNWUwYTkxODNh?sa=X&ved=0CAcQuIEEahcKEwjwhpCd5pPuAhUAAAAAHQAAAAAQRw
B. H. Roberts e o Livro de Mórmon - Parte 2. Disponível em: https://podcasts.google.com/feed/aHR0cHM6Ly9hbmNob3IuZm0vcy8zODRmZDkwOC9wb2RjYXN0L3Jzcw/episode/MTI2NDhkOTgtY2RmMi00MWUyLTljZDEtMjgwZDQ4NjZkNzcw
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Livro de Mórmon. Alma 4:6 - Seda
Livro de Mórmon. 1 Néfi 18:25 - Cavalos
Livro de Mórmon. Ênos 1:20 - Cimitarra
Livro de Mórmon. 1 Néfi 5 - Descendentes de hebreus
Livro de Mórmon. Mórmon 9:32 - Egípcio reformado
Livro de Mórmon - Plágios. Disponível em: http://sobreomormonismo.blogspot.com/2019/07/livro-de-mormon-plagios.html
Mormon Stories - LDS 1336. Disponível em: https://podcasts.apple.com/us/podcast/mormon-stories-lds/id312094772?i=1000483920476
O egípcio reformado. Disponível em: http://sobreomormonismo.blogspot.com/2011/07/o-egipcio-reformado.html
O Livro de Mórmon hoje. disponível em: http://sobreomormonismo.blogspot.com/2016/04/o-livro-de-mormon-hoje.html
O que é arqueologia? Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/geografia/o-que-e-arqueologia.htm
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Studies of the Book of Mormon. disponível em: https://www.amazon.com.br/Studies-Book-Mormon-English-Roberts-ebook/dp/B076HMF7P9/ref=sr_1_3?__mk_pt_BR=%C3%85M%C3%85%C5%BD%C3%95%C3%91&dchild=1&keywords=studies+book+of+mormon&qid=1610323575&s=books&sr=1-3
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